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Passado, presente, futuro
“É possível ver muitos ARPAs aqui nessa sala”. A fala de Manoel Serrão, superintendente de Programas do FUNBIO, resumiu bem a oficina ARPA 15 anos: Lições Aprendidas, que aconteceu em Brasília nos dias 1 e 2 de outubro. O evento foi promovido pelo FUNBIO com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). As discussões serão sistematizadas e enviadas ao Ministério do Meio Ambiente (MMA) para compor uma publicação comemorativa do programa.
O encontro colocou na mesma sala os ‘jurássicos’ do programa – como foram carinhosamente apelidados os mais antigos – e os que chegaram há menos tempo. Estava lá gente que nem participa mais do ARPA, mas que fez parte de seu nascimento. Gente que na infância do programa respondia pelo governo, mas hoje contribui como representante da sociedade civil. E vice-versa. Muitos olhares que se complementavam. E que traziam em comum uma mesma busca, ontem e hoje.
“Sou da época da luta. Mas era uma luta que tinha como ambição a parceria, a efetividade e a inovação para a conservação de larga escala. Era um grande desafio criar uma identidade e uma agenda comum entre tantas instituições diferentes”, relembra Ronaldo Weigand, que nos primórdios do ARPA estava no MMA e hoje tem uma empresa de consultoria ambiental.
Num clima que mais parecia um encontro de velhos amigos, todos olharam juntos para o passado e o presente, tentando tirar dali aprendizados para escrever as novas páginas do programa. Foram dois dias para recordar, refletir e também celebrar. Se no início o ARPA parecia um eterno bate-cabeça, logo o programa decolou para se tornar referência mundial. Mas antes do sucesso, veio o engajamento. “Se você olhar para cada um que foi entrando na história do programa, vai ver que todos têm uma entrega. As pessoas estão aqui por um compromisso em comum”, afirma Manoel Serrão.
Talvez esse tenha sido o atalho para que as diferenças institucionais fossem aos poucos convergindo para uma mesma agenda. Quando muitas pernas resolvem marchar em uma mesma direção, as rotas vão se abrindo. “No momento em que conseguimos estabelecer as relações de parceria, criou-se um ambiente muito mais favorável para a construção”, diz Daniela Leite, que passou anos à frente do ARPA pelo FUNBIO.
Parceria não é palavra qualquer. Predispõe abertura e escuta atenta ao outro. Exige humildade para reconhecer erros. E ousadia para arriscar novas rotas. O ARPA tem tudo isso. “A receptividade e o diálogo para transpor as dificuldades é uma característica muito forte aqui dentro. O programa tem uma flexibilidade, uma capacidade adaptativa”, diz Lourdes Iarema, gestora do Parque Nacional do Juruena.
Um exemplo concreto disso foi a criação da Comissão dos Gestores, que não existia e nasceu após a reivindicação de quem estava na ponta. “Isso permitiu que as instâncias pensassem com a cabeça de quem está operando em campo, e nos deu maior poder de decisão no programa”, diz Patricia Pinha, gestora da Reserva Biológica do Lago Piratuba. “A estrutura de um programa tão complexo e com tantos anos não pode ser estática. Ela deve estar aberta a mudanças”.
Não é à toa que o ARPA atravessou inúmeros governos, ministérios e, 16 anos depois, continua crescendo. Para João Paulo Sotero, diretor de Áreas Protegidas do MMA, o programa é um grande laboratório de inovação, e fonte inesgotável de referências que podem nutrir políticas públicas mais modernas e eficazes. Dos mecanismos financeiros aos protocolos de compras e serviços, ele defende que o que nasceu no ARPA não deve morrer ali. “Para nós o ARPA é estratégia. Precisamos pensar como suas inovações podem extrapolar o programa e chegar a todo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação”.
ARPA para a vida
Durante os dois dias de oficina, os convidados também foram chamados a olhar para o futuro do programa – que está traçado até 2039. Mesmo com um longo passado de conquistas, o que vem pela frente ainda preocupa algumas pessoas, dada a pouca relevância que a área ambiental costuma ter nos orçamentos dos governos. “Os cenários postos são no mínimo de dúvidas. Alguns dizem que o modelo vai falir no futuro”, reconhece Manoel Serrão. Mas ele garante: “Não falta dinheiro: o Brasil é um país rico. O que falta é significado”.
Sobre isso, parece haver um consenso: as unidades de conservação devem estar no centro da política ambiental. E mais: elas precisam fazer parte da vida dos brasileiros. Potencial não falta. Somente em 2017, mais de 15 milhões de pessoas foram sentir a natureza de perto nas unidades de conservação do país. “Precisamos trabalhar melhor a comunicação do ARPA. Quanto mais gente olhando para as UCs, teremos mais recursos para elas”, diz Renata Gatti, da Unidade de Coordenação do Programa (UCP) no MMA.
Para além das ferramentas de comunicação, os gestores defendem que o ARPA passe a adotar linhas de apoio a cadeias produtivas, uso público e voluntariado nas unidades. “Não temos reverberação na sociedade porque as pessoas não conhecem nossas unidades e seu potencial”, diz Tiago Juruá, gestor da Reserva Extrativista do Cazumbá-Iracema. “Precisamos ter a participação da sociedade nos processos de gestão. Esse envolvimento possibilita a divulgação das UCs e de seu papel nos contextos social e ambiental”, completa Lourdes.
Mais de 15 anos depois, ainda há muito trabalho pela frente. Mas a oficina de Lições Aprendidas deixou claro que os desafios do ARPA não são maiores que a vontade de superá-los. “Saímos daqui reenergizados e com ainda mais senso de compromisso”, afirma Renata Gatti, do MMA.