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Levantamento identifica espécies raras e ameaçadas em parque no Pampa brasileiro
O Parque Estadual do Espinilho, localizado em Barra do Quaraí (RS), conserva os últimos remanescentes de uma vegetação única e ameaçada no Pampa brasileiro. A unidade de conservação (UC) de 1.617,14 hectares vem desempenhando um papel crucial para o futuro da restauração dos campos nativos, que há décadas estão sendo degradados pela ação humana.
“A relevância do [Parque Estadual do] Espinilho é inestimável”, cita o gestor da UC, Maurício Scherer. “Se não existisse, esse ecossistema único no país já teria desaparecido. O parque abriga um ‘microbioma’ dentro do bioma Pampa. Esse ecossistema é encontrado em abundância somente na Argentina”, afirma.
A importância da biodiversidade local mobilizou pesquisadores do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Recuperação de Áreas Degradadas (NEPRADE) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) a realizar um levantamento detalhado da vegetação no parque. O trabalho é parte do projeto RestauraPampa, que teve início em 2021, para a elaboração do Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD), a implementação de estratégias de controle do capim-annoni (Eragrostis plana) e a recuperação da vegetação nativa em 100 hectares no Parque Estadual do Espinilho e na Reserva Biológica do Ibirapuitã.
A pesquisa teve a primeira apresentação de resultados em outubro de 2022. A segunda apresentação de resultados, em julho de 2023, traz um levantamento abrangente da vegetação da UC, com a presença de 35 espécies de árvores e arbustos em uma área de 8 mil metros quadrados amostrada. Algumas das espécies identificadas, como o inhanduvá (Neltuma affinis), o algarrobo (Neltuma nigra) e o quebracho-branco (Aspidosperma quebracho-blanco), são classificadas como vulnerável, criticamente ameaçada e em perigo, respectivamente, no Rio Grande do Sul.
Os pesquisadores descobriram ainda a ocorrência de 175 espécies de ervas na área estudada, incluindo plantas raras e ameaçadas de extinção, como o cacto Parodia turbinata, que só é encontrado dentro dos limites do parque. Outra descoberta surpreendente foi a identificação da bromélia Dyckia pampeana, uma espécie restrita ao sudoeste gaúcho, cuja presença era desconhecida na UC.
O levantamento detalhado da vegetação é apenas a etapa inicial para a elaboração do PRAD, cuja primeira versão será apresentada à equipe de gestão do parque em setembro de 2023. A versão final do documento está prevista para ser entregue em abril de 2024. O plano guiará as ações de restauração a serem implementadas futuramente no parque, e servirá de subsídio para a tomada de decisão pela equipe gestora.
“A porção brasileira do Pampa tem sofrido perdas significativas de vegetação nativa nas últimas décadas, principalmente devido à conversão dos campos em lavouras de soja e à expansão da silvicultura. A pesquisa que fizemos destaca a riqueza de espécies ameaçadas e exclusivas encontradas no parque, reforça a importância da conservação no bioma e aponta caminhos para estratégias e ações de restauração e conservação”, enfatiza um dos pesquisadores responsáveis pelo levantamento, Guilherme Diego Fockink.
O estudo também registrou a invasão biológica do capim-annoni no parque, uma ameaça ao ecossistema único da região. Quando concluído, o PRAD fornecerá métodos e estratégias para combater esse capim exótico de origem africana. O capim, que tem crescimento rápido e pode alcançar 60 centímetros de altura, afeta negativamente espécies nativas da flora local.
O trabalho desenvolvido pelo projeto não apenas revelou a diversidade de espécies no parque, mas também desvendou processos ecológicos anteriormente desconhecidos. Isso o torna uma referência valiosa para estratégias futuras de restauração dos campos nativos.
Fockink destaca que o RestauraPampa deixará um legado de colaboração para outros projetos de restauração dos campos nativos, transformando o Parque Estadual do Espinilho em um laboratório para descobrir técnicas inovadoras de recuperação do Pampa.