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As plantas únicas e ameaçadas da Serra do Espinhaço
A Cadeia do Espinhaço se estende por mais de mil quilômetros, desde o centro-sul de Minas Gerais até a Chapada Diamantina, na Bahia. Para além de uma paisagem imponente, as montanhas são o ambiente onde floresce uma vegetação exclusiva do Brasil e extremamente biodiversa: os Campos Rupestres. Este ecossistema prospera nas alturas, acima dos 900 metros de altitude, e é caracterizado pelas plantas de pequeno porte e arbustos que formam mosaicos entre a vegetação e os afloramentos rochosos, sendo o lar de espécies únicas. Em seu projeto de pesquisa de mestrado, Lucas Borges de Lima, selecionado em 2022 pelo Programa Bolsas FUNBIO – Conservando o Futuro, dedica-se a fazer um levantamento florístico em uma das porções do Espinhaço, na região do Planalto da Diamantina, em Minas Gerais.
Os Campos Rupestres cobrem menos de 1% do território nacional. Ainda assim, representam cerca de 14% de toda a flora vascular brasileira. O objetivo da pesquisa realizada por Lucas, mestrando em Botânica do Instituto de Biociências – Universidade de São Paulo (USP), tem como destaque identificar as espécies endêmicas, ou seja, que ocorrem apenas no Espinhaço e nos Campos Rupestres, e ameaçadas de extinção. Além disso, o biólogo pretende ajudar a suprir lacunas de conhecimento sobre as espécies que ocorrem neste ambiente montanhoso.
Para realizar o levantamento, o pesquisador reuniu todas as informações disponíveis em bancos de dados de herbários e foi a campo para fazer coletas na região, inserida na Reserva da Biosfera Serra do Espinhaço.
Ao todo, foram identificadas mais de mil espécies de plantas, sendo aproximadamente um terço delas endêmicas na Serra do Espinhaço e cerca de 8% em algum grau de ameaça de extinção.
A lista inclui espécies emblemáticas, como o quiabo-da-lapa (Cipocereus minensis), cacto nativo nos Campos Rupestres, facilmente identificado por seus frutos azuis. Relativamente comum na região, ainda que classificado como Vulnerável ao risco de extinção, o cacto é uma Planta Alimentícia Não-Convencional usada em inúmeras receitas.
O pesquisador cita ainda a Microlicia cogniauxiana, arbusto endêmico da Serra do Espinhaço e parte de um dos gêneros mais importantes para flora do Planalto Diamantina, cuja flor lilás colore a paisagem dos Campos Rupestres.
Parte da família das canelas-de-ema, a Barbacenia Exscapa é outro exemplo de planta que só pode ser encontrada na Serra do Espinhaço e está Criticamente Em Perigo de extinção. A pesquisa de Lucas, entretanto, trouxe uma boa notícia: “durante os campos encontramos uma nova subpopulação da espécie”, comemora.
O trabalho se dedicou a entender também quais os principais desafios para a conservação dessas espécies. “Encontramos algumas espécies endêmicas e ameaçadas que não ocorrem em unidades de conservação de proteção integral, o que representa um desafio para a proteção da biodiversidade local”, comenta o biólogo.
É o caso de uma rara e pequena palmeira, com apenas 1 metro de altura, que cresce em meio ao solo rochoso. A espécie, batizada pela ciência de Syagrus mendanhensis, está classificada como Criticamente Em Perigo – o grau mais alto de risco de extinção – e suas populações estão desprotegidas, fora dos limites das unidades de conservação.
A pesquisa está na fase final, adianta o biólogo, e em breve os resultados serão publicados com mais detalhes, esclarece Lucas.
Esses dados serão fundamentais para alimentar o Plano de Ação Territorial (PAT) Espinhaço Mineiro, parceiro de Lucas no projeto. O PAT tem como objetivo garantir a conservação de espécies ameaçadas de extinção no Espinhaço Mineiro e é executado no âmbito do Projeto Pró-Espécies, financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, sigla em inglês) e implementado pelo FUNBIO. O biólogo contou ainda com apoio do Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais (IEF-MG) e da Área de Proteção Ambiental (APA) Águas Vertentes.
“Todos esses parceiros foram essenciais para as atividades de campo. No início do trabalho, o plano era realizar coletas somente no município de Diamantina, mas graças aos apoios que recebemos, conseguimos expandir a área para outros municípios do Planalto Diamantina, como Serro, Serra Azul de Minas, Buenópolis e Couto de Magalhães de Minas”, destaca Lucas.
Com isso, foi possível explorar regiões em que antes não haviam sido feitas coletas ou que eram sub amostradas. “Isso é muito relevante, pois ajudar a preencher essas lacunas de coleta permite subsidiar (em dados) trabalhos futuros sobre a flora da região e também orientar ações de conservação”, acrescenta.
Os afloramentos de rocha de onde florescem os Campos Rupestres são compostos principalmente por quartzito, arenito e substrato ferrífero, o que põe a área na mira da mineração, uma das principais ameaças a estes ambientes. “Na região do Planalto Diamantina esse avanço se dá especialmente na extração de quartzito para uso na construção civil”, alerta o pesquisador. “É importante ressaltar que, devido a essas características ambientais e a alta proporção de endemismos, essa vegetação é muito sensível a ameaças causadas por atividades humanas”, completa.