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Restauração com 100 mil mudas nativas envolve comunidades no Rio Grande do Norte
Luís das Mudas no viveiro que inaugurou na comunidade de Juremal. Foto: Arquivo pessoal
Nos últimos dois anos, o projeto Furna Feia: Recuperação de áreas degradadas e apoio à sustentabilidade local, coordenado pela SOS Sertão, vem implantando uma metodologia de trabalho que já levou ao plantio de 100 mil mudas de espécies nativas da Caatinga em ações de restauração que envolvem as comunidades do entorno do Parque Nacional (Parna) da Furna Feia.
“O projeto mostra que é possível plantar na Caatinga. Quebra o tabu de que não tem como plantar árvores no bioma, de que a planta morre na seca. Não é isso. Provamos que é necessário conhecer a área – ou seja, fazer um diagnóstico e entender o terreno, a qualidade do solo, as questões técnicas – para implantar um projeto de restauração”, destaca o coordenador da SOS Sertão, Joaquim Araújo de Melo Neto.
O Parna, que foi criado em 2012, tem uma área de 8,5 mil hectares entre os municípios de Baraúna e Mossoró, no Rio Grande do Norte. O projeto Furna Feia visa a manutenção e a conservação da biodiversidade no parque, atuando no plantio de mudas nativas em aproximadamente 100 hectares de áreas degradadas.
Melo Neto conta que a primeira ação do projeto Furna Feia foi realizar um diagnóstico para descobrir as melhores técnicas de plantio de mudas em áreas degradadas no parque. Ainda no primeiro ano, foram definidas a metodologia de trabalho e as técnicas experimentais de restauração, em especial o plantio direto na época seca, o plantio em faixas e o plantio em núcleo.
O projeto, que já se encontra em sua fase final, realiza nesta etapa a manutenção das áreas degradadas que receberam o plantio de mudas nativas. O monitoramento das técnicas implementadas foi feito entre agosto e setembro. A expectativa é de que a mudança na cobertura vegetal nativa seja visível em até seis anos.
Envolvendo a comunidade na restauração
Um desafio para realizar as ações de restauração era obter um número suficiente de mudas nativas. O diagnóstico realizado pela equipe técnica da SOS Sertão mostrou que as comunidades locais tinham pouca informação sobre como produzir mudas de espécies nativas ou mesmo coletar sementes. Como estratégia, o projeto desenhou um plano de capacitação, gerando um negócio emergente e promissor para moradores em comunidades locais.
“Buscamos gerar renda pela compra de mudas de espécies nativas. Adquirimos de 20 mil a 30 mil mudas de viveiros localizados nas 10 comunidades na zona de amortecimento do Parna”, afirma Joaquim. O restante das mudas veio de outros viveiros no bioma.
A capacitação permitiu que a equipe técnica da SOS Sertão engajasse mais pessoas no fornecimento de mudas para a restauração. Um curso via aplicativo de troca de mensagens de celular ensinou, em 10 vídeos explicativos, o passo a passo para a coleta de sementes, quebra de dormência e produção de muda nativa. Mais de 90 pessoas completaram o curso, realizado nos seis primeiros meses de pandemia pela Covid-19, em 2020. Quem se identificava com a proposta de criação de um viveiro, recebia assessoria técnica da SOS Sertão em visitas presenciais às propriedades rurais.
A primeira produção de mudas como resultado desse esforço começou em dezembro de 2020. Em dois anos de projeto, 10 pessoas da região passaram a produzir mudas de 34 espécies nativas.
Solução local para a Caatinga
Moradores na comunidade de Juremal, em Baraúna (RN), o casal de agricultores Edna Lima de Souza Silveira e Luís Carlos Silveira fundou o viveiro Flor da Caatinga nos primeiros meses de 2021. A comunidade tem dois mil habitantes e fica na zona de amortecimento do Parna.
Luís das Mudas, como é conhecido na região, demonstrou interesse em tentar o plantio de mudas depois que participou como aluno na capacitação da SOS Sertão. “Peguei conhecimento da área ambiental quando trabalhei como brigadista no parque, em 2013. Aprendi sobre as árvores da Caatinga, mas não sabia como ajudar o bioma a produzir muda ou quebrar a dormência de sementes”, relata Luís.
Começou plantando pinhão-bravo e jurema-preta no quintal de casa. Para sua surpresa, as sementes germinaram com as técnicas que aprendeu no curso. Então, convidou a esposa Edna para passar um dia trabalhando com ele no viveiro recém-criado. “Sempre gostei do cheiro da mata, o ar diferente. No viveiro, vi que podia ajudar porque a gente precisa da planta nativa. A Caatinga precisa delas. Eu me sinto privilegiada por ajudar a natureza”, diz Edna.
Hoje, o viveiro está lotado com 40 mil mudas de 24 espécies nativas, como quixabeira, jucá (pau-ferro) e jurema-branca. Além do contrato de fornecimento para a SOS Sertão, tem clientes na Bahia, no Ceará, em Goiás, em Minas Gerais, no Paraná, em Pernambuco e no Rio Grande do Norte.
Edna opera os serviços de busca e mídias sociais na internet para se conectar com quem trabalha com mudas de plantas. Um perfil em mídia social é usado como vitrine para venda de mudas e troca de informações.
“Pelo nosso viveiro, estimulo outras pessoas da região que se interessam e querem produzir muda e coletar semente nativa. Penso em criar reuniões para ajudar e multiplicar o conhecimento. Sinto que o povo daqui abriu a mente e entendeu a importância de proteger a natureza e a Caatinga”, projeta Luís das Mudas.